Jesus, o Nazareno que posteriormente ficou conhecido como Jesus, o Cristo [aquele que alcançou o estado crístico, assim como Buda é aquele que alcançou o estado búdico].
Não tinha Facebook, nem Twitter, nem Youtube etc, mas tinha seguidores que compartilhavam tudo que ele dizia.
Assim como Sócrates [que batia um bolão na Grécia antiga], Ele próprio nunca postou nada, nem mesmo uma selfie, um vídeo andando sobre as águas ou uma fotinho do pão da última ceia seguida de comentários sobre a safra do vinho que foi servido.
Se hoje conhecemos as embaixadinhas, firulas e – principalmente – o os dribles desconcertantes de Sócrates, devemos isso a seus seguidores e, sobretudo a um deles: Platão. Contudo, assim como na Alegoria da Caverna, o Sócrates que nos foi permitido conhecer é apenas uma sombra do craque da época… É um Sócrates platônico, digamos. Há, obviamente, fragmentos de comentários dos cronistas da época que dão conta de lances clássicos e disputas memoráveis. Sabe-se que ele, Sócrates, concedia entrevistas regularmente, quase sempre exclusivas: ele apreciava o corpo à corpo e não abria mão de dialogar com seu entrevistador.
Jesus, por sua vez, era um orador nato, destes a quem a multidão segue para ouvir-lhe a palavra. Como a internet naquele tempo era muito lenta e os celulares muito caros, só os senadores podiam tuitar. Nos top trends da época as hashtags eram #VaiLeão, #RomaWin, #JesusFail, etc. Em latim, claro! Sem mencionar que Jesus era comunista e exigia que seus seguidores mais abastados vendessem seus celulares e tablets e doassem o dinheiro a comunidade para garantir o pão e o vinho para todos igualmente.
Sem celulares para postar em tempo real o que seu ídolo dizia e fazia, os seguidores de Jesus precisavam registrar em sua própria memória [não sabemos quantos Kilobytes cada um possuía] as palavras que ele dizia. Quando a multidão era muito grande, na falta de microfones e alto-falantes, todos brincavam de telefone-sem-fio, retransmitindo aos detrás o que gritava o cara em cima do morro.
Apesar de toda sua popularidade como orador, prático de família [exercia ilegalmente a medicina e mandava parte do salário para Cuba], marceneiro e fornecedor de vinho para eventos, o comunista cabeludo – que defendia reformas sociais, não era casado e defendia os direitos das prostitutas – foi derrotado, na primeira assembleia de que participou, por um político clássico de direita chamado Barrabás.
Mas, nada disso foi tuitado e nem mesmo as cenas de espancamento, de abuso de autoridade e violência excessiva da polícia romana [tradição que os policiais do mundo inteiro fazem questão de conservar até o presente] geraram postagens de protesto no facebook. Tudo que sabemos sobre isto nos foi contado bem depois, de acordo com os kilobytes de memória que cada um possuía para registrar os fatos.
Depois disso, já que Jesus havia sido executado pela ditadura de Roma e nada mais dizia, seus seguidores, que não tinham mais o que compartilhar precisaram produzir suas próprias postagens. Como eles não tinham outros assuntos e os gatinhos ainda não eram populares no youtube, resolveram buscar na memória as palavras do ídolo para postar citações. Alguns produziram narrativas mais longas para seus blogs em formato de crônica jornalística.
150 anos depois, quando todos os tuiteiros, blogueiros sujos e facebookianos que haviam sido seguidores de Jesus já haviam morrido, um grupo de padres espertalhões decidiu desenterrar seus posts e juntar tudo em uma única página sobre o tema [algo como “O Pensador”] dividida por autores. Mas a página só podia ser acessada por que possuísse login e senha, e os admin iam editando os posts originais conforme os comentários dos usuários. Nessa época resolveram também banir Marcião do site e deletar seus posts que defendiam que fossem outros os tuites e posts escolhidos para compor o Cãnone. Os usuários eram padres, os admin eram bispos e o Google tradutor só tinha os idiomas hebreu, grego e aramaico.
Isto facilitou a vida dos padres internautas da época que já tinham de onde tirar as citações para suas postagens dominicais [embora a atribuição à autoria já fosse um problema] e que, graças a estas passaram a ter muitos seguidores também. Como todos os padres tinham a mesma fonte [Cânone –Work In Progress] e postavam as mesmas coisas, seguir um padre ou outro não fazia diferença, então cada um seguia o padre mais próximo que, por sua vez, seguia os bispos. Mas foi apenas 325 anos depois do nascimento de Jesus [que então era Jesus de Belém] que os bispos admin do site chegaram a um consenso sobre que tuites, posts e blogs poderiam ser publicados no site e resolveram torna-lo não mais editável. Nascia ali o www.canone.com!
Os bispos admin decidiram que os tuites, blogs e posts de Marcos, Mateus, Lucas e João seriam, a partir de então, a biografia oficial de Cristo [como eles chamariam Jesus daquele momento em diante], e que os docetas, os ebionistas e blogueiros sujos de outras seitas seriam banidos [hereges] e seus posts deletados [apócrifos].
Em 406, um sujeito chamado Jerônimo, e que não era índio nem santo [ainda] foi de Roma para Jerusalém a mando do papa, para estudar programação hebraica e incluir o Latim ao google tradutor. Depois disso a front page do site [http://www.canoneoficial.com] passou a ser em latim.
Em 1439 um alemão chamado Gutenberg inventou um jeito de imprimir livros, e os bispos e padres, que a esta altura já tinham milhares de seguidores graças às suas citações em latim [que só eles falavam] retiradas do site Cânone Oficial, decidiram imprimir aquele que seria o primeiro livro e o maior best seller da história [até agora] e que inauguraria uma tradição literária de que autores e descendentes não veriam um tostão do direito autoral.
Em 1455 ficou pronto o livro chamado Bíblia, que por sua vez significa “livros”, e era a versão impressa do site Cânone Oficial em latim. Outro alemão, chamado Martinho, achou que a tradução do hebreu para o latim não estava boa e traduziu do hebreu e do grego para o alemão 70 anos depois. Além de outra versão do livro Bíblia [livros], ele criou um site de protesto [http://www.lutero.org.de] que rapidamente ganhou milhares de seguidores que ficaram conhecidos como protestantes.
Desde então o Google tradutor foi ampliado e o livro Bíblia [livros] foi traduzido para 2.454 idiomas e, em muitos deles com diversas traduções diferentes. Nele [no livro] estão contidos os tuites, posts e blogs da época de Jesus, devidamente editados pelos copiadores, revisores, editores e, finalmente, pelos webmasters do Canône Oficial, com exceção daqueles que os padres não gostaram, que dariam muita mão de obra para editar e que era mais fácil banir os simpatizantes e deletar os arquivos. O livro continha também estórias antigas de muito antes e que ninguém sabe quem escreveu, mas este não é o assunto deste post.
Assim como o craque grego Sócrates, Jesus [que nasceu de Belém, virou Nazareno, foi aclamado rei de um povo que diz que ele nunca existiu, virou “O Cristo”, foi traído, preso, julgado e condenado – numa eleição direta por aclamação – à pena de morte] jamais publicou uma selfie, um status, um tuite sequer. Tudo que se atribui a ele foi retirado de tuites, posts e blogs antigos que tampouco se pode comprovar a autoria.
O que se conclui a partir disso é que aqueles que hoje se dizem seguidores de Jesus [que não tinha Facebook, Twitter, nem Blog] são seguidores, na verdade, dos copiadores, revisores e editores de seus supostos biógrafos, selecionados [os biógrafos] dentre centenas de outros, por padres que morreram há 1800 anos, todos eles funcionários da Igreja Católica, ou são seguidores dos tradutores [como Martinho, o protestante alemão], que são milhares.
O Cristianismo, portanto, não existe fora da religião que o cunhou a duras penas ao longo de séculos. A palavra [atribuída] de Jesus é a palavra que a religião católica quis lhe atribuir.
Em 1973, Mário Quintana lançou um livro chamado Caderno H. Nele estava escrito: “A gente pensa uma coisa, acaba escrevendo outra e o leitor entende uma terceira coisa… e, enquanto se passa tudo isso, a coisa propriamente dita começa a desconfiar que não foi propriamente dita.”
É certo que o livro chamado “caderno” não se referia ao livro chamado “livros”, mas “desconfiar que a coisa não foi propriamente dita” parece tão certo quanto saber que a imprensa e aqueles que costumam narrar os fatos, não é de hoje que não merecem credibilidade.
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